Quando as coisas correm menos bem, os meios de comunicação social encarregam-se de informar, gerando dessa forma uma consciência mais colectiva para a necessidade de protecção e valorização dos bens patrimoniais, como é exemplo o artigo que aqui se transcreve do jornal Diário do Nordeste.
"Do achado arqueológico revelado em 1981 - e festejado por instâncias ligadas à cultura, como registrou a edição número 1 do Diário do Nordeste - à condição de ruínas novamente esquecidas: de lá para cá, apenas o tempo agiu efetivamente sobre os vestígios do Fortim de São Luiz, no bairro Serviluz. No início da década de 1990, a arqueóloga Miriam Cazzetta liderou uma visita ao local, acompanhada por alunos da disciplina de Introdução à Arqueologia, da Universidade Estadual do Ceará (Uece).
Vinte anos depois, ela relembra o episódio e analisa a atual realidade brasileira no que diz respeito ao patrimônio arqueológico que, como no Mucuripe, situa-se em áreas urbanas e compõe o cenário edificado de suas comunidades.
"Foram identificados e localizados dez sítios arqueológicos (líticos, lito cerâmicos, cerâmicos e históricos) situados principalmente em áreas de duna", detalha. Uma experiência piloto chegou a ser desenvolvida nos municípios de Trairi e Paraipaba, mas, no caso das ruínas da fortificação do Mucuripe, acabou não indo adiante.
Conservação
Fortaleza, ilustra a pesquisadora, possui, pelo menos, outros quatro sítios urbanos que estavam entre os relacionados no projeto: as unidades de defesa da Segunda Guerra Mundial, o engenho Alagadiço Novo, em Messejana, onde funciona a Casa de José de Alencar, e aldeamentos religiosos da Parangaba e Messejana. Para este tipo de sítio arqueológico, localizado em área urbana, reforça, é necessário um envolvimento da comunidade do entorno com a conservação.
A descoberta das ruínas do forte e a expectativa de sua preservação e estudo foram temas de uma reportagem publicada na primeira edição do Diário do Nordeste, com direito a destaque de capa naquela edição histórica
"A tutela do Patrimônio Histórico, Arqueológico e Arquitetônico diz respeito não somente ao Estado, mas a todos os membros da sociedade, pois ela não é um fato puramente administrativo e jurídico, porém científico e de exercício de cidadania", avalia. Miram Cazzetta explica que, de acordo com a Constituição Brasileira, os sítios arqueológicos são considerados bens da União e uma Lei específica, de número 3.924/61, considera crime contra o Patrimônio Nacional qualquer ato que implique em sua destruição.
É também essa a Lei que obriga a realização de pesquisa antes de qualquer obra que possa causar dano a estes espaços. "Todo sítio arqueológico é parte integrante da base de recursos culturais não renováveis da humanidade, em geral, e das nações em que se encontram, em particular. Portanto, sua destruição implica a perda irreversível de uma parcela de nossa herança cultural", diz.
A maior dificuldade, atualmente, encontrada em órgãos de planejamento e infraestrutura urbana, explica, é a complexidade das situações onde é necessária a intervenção, quase sempre coincidindo com o inicio dos trabalhos de engenharia. Há uma dificuldade em se gerir em um mesmo espaço um canteiro arqueológico e outros de obras civis. "O processo de intervenção arqueológica exige etapas específicas que demandam tempo e pessoal especializado para a intervenção arqueológica propriamente dita", pontua.
Turismo
A pesquisadora defende que o uso de sítios arqueológicos e edifícios de valor histórico como fomentadores de um turismo qualificado é uma maneira de preservar o patrimônio e de contribuir com o desenvolvimento das comunidades em que estão inseridas. A musealização destes bens, detalha, permite que a população usufrua dele e o reconheça, mais claramente, como uma referência cultural.
"O relacionamento entre passado, presente e futuro não é simplesmente de interesse da análise histórica. Isto tem uma importante função no nível psicológico, individual e coletivo. A representação do passado são as memórias do futuro", pontua. Ao passo que o objeto arqueológico funciona como um documento do passado, sob esta perspectiva, defende a arqueóloga, ele assume também um papel fundamental para a compreensão do processo de formação e desenvolvimento de uma cidade e de suas comunidades.
"É necessário fazer uma melhor conexão do passado, presente e futuro para sobrepor a tendência de ver o passado como algo que é acabado em si mesmo e que agora tem simplesmente um valor nostálgico, acadêmico ou de entretenimento", resume. (FM)"
Fonte: Diário do Nordeste