Descoberto artefacto do período Neolítico que documenta ritual considerado único

Uma varinha esculpida com dois rostos humanos  foi descoberto no sul da Síria, num assentamento datado do Neolítico.

O artefacto foi descoberto junto de uma necrópole onde cerca de 30 pessoas foram enterradas sem as cabeças, que também foram encontrados num espaço diferente e nas proximidades dos corpos.

As datações até ao momento efetuadas datam a descoberta com cerca de 9000 anos de idade. "A descoberta é muito incomum. Ela neste momento é considerada única", disse um dos responsáveis pela intervenção arqueológica do sítio, Frank Braemer, arqueólogo no Centro Nacional de Pesquisa Científica de França.

Os investigadores descobriram a primeira varinha durante as escavações arqueológicas realizadas em 2007 e 2009 num local no sul da Síria chamado Diga Qarassa, onde foi identificada uma estratigrafia que forneceu informações sobre diferentes milénios.

Apesar de muitos sítios arqueológicos terem sido saqueados ou bombardeados desde o início da guerra civil síria , este local está situado numa área bastante tranquila e até agora tem escapado aos danos que neste país têm sido perpetrados ao património cultural.


Outra evidência arqueológica recolhida no local sugere que os seus antigos habitantes estavam entre os primeiros agricultores do mundo , consumindo uma espécie de trigo, cevada, grão de bico e lentilhas, cabras, gazelas, porcos e veados, o que sugere que estas pessoas já praticavam a pastorícia, escrevem os responsáveis pela escavação arqueológica na edição de março da revista Antiquity.

Depois que os esqueletos e a pequena varinha terem sido enterrados, alguém parece ter desenterrado e removido os crânios, tendo-os colocando numa parte destinada à habitação que foi identificada no assentamento arqueológico.

A varinha é feita a partir de um osso, provavelmente a partir de uma costela de um auroque,  e possui cerca de 12 centímetros de comprimento. Duas faces de aparência naturalista, com os olhos fechados, foram esculpidas neste suporte, embora a varinha tenha sido intencionalmente partida em ambas as extremidades, o que sugere que possuía mais representações faciais.

O propósito e o simbolismo da relíquia permanecem um mistério. "Está claramente ligada a rituais funerários, mas a que tipo de rituais é impossível dizer", disse Frank Braemer.

A descoberta marca uma transição importante em termos estilísticos, uma vez que representa de forma mais naturalista o ser humano. Artefactos mais antigos normalmente mostram representações estilizadas ou a esquematização de seres humanos, em contraponto com as representações realistas de animais. Alguns outros exemplos do mesmo período desenterrados em áreas onde atualmente é a Jordânia e a Anatólia também documentam esta tendência naturalista para representar a forma humana, sugerindo que essa prática surgiu simultaneamente em diferentes parte do Médio Oriente, disse Braemer.

A inovação artística pode ter sido despoletada pelo desejo emergente para criar representações materiais de identidade e personalidade, escrevem os autores no artigo da Antiquity.

A razão por que alguém desenterrou os crânios e os colocou dentro das áreas residenciais, onde se processava a vida quotidiana das pessoas de então, também constitui uma incógnita. Mas outros arqueólogos exumaram achados semelhantes em Jericó, Israel, datados também com cerca de 9.000 anos, em que os crânios dos antepassados foram cobertos com gesso e pintados com as características faciais, de forma a poderem ser exibidos em espaços vivos de convivência e sociabilidade.

Uma das hipóteses colocada pelos investigadores é a de que a prática era uma forma de culto aos antepassados, em que os rostos humanos representavam a presença viva de seres sobrenaturais que se manifestavam perante os vivos através de uma forma mais humanizada.

Referência: Antiquity. Volume: 88 Number: 339 Page: 81–94 The human face and the origins of the Neolithic: the carved bone wand from Tell Qarassa North, SyriaJuan José Ibáñez1, Jesús E. González‑Urquijo2 and Frank Braemer3


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