O que matou os animais gigantes - as alterações climáticas ou o homem?

A "Megafauna" da Terra desapareceu quando as tribos de humanos se espalharam ao longo do planeta. Agora os paleontólogos perguntam-se se os primeiros humanos foram a causa desta extinção. As interrogações e o debate farão parte da conferência  Megafauna and Ecosystem Function, que se realizará na Universidade de Oxford durante a próxima semana.

FOTO. WIKIPÉDIA (gliptodonte)
Vistos hoje, são dos animais mais estranhos para andarem na terra: vombates tão grandes como hipopótamos, preguiças maiores do que os ursos, elefantes descomunais e tatus de tamanho desmesurado. Estes animais viveram no nosso planeta durante milhões de anos e desapareceram logo que os seres humanos surgiram e se espalharam pelos diferentes continentes.

É um dos mistérios mais intrigantes da paleontologia e irá ser o objeto de um debate promovido na Universidade de Oxford, onde será discutido se foi a mudança climática ou os caçadores humanos que mataram a megafauna que existiu no nosso planeta.

"Criaturas como a “Megatherium”, a preguiça gigante e o gliptodonte, uma espécie de tatu maior do que o antigo carocha da Volkswagen , desapareceram da América do Sul há cerca de 10.000 anos , quando houve grandes mudanças no clima - que alguns cientistas acreditam que desencadeou estas extinções", disse Yadvinder Malhi, professor de ciência dos ecossistemas em Oxford, um dos organizadores da conferencia, Megafauna and Ecosystem Function.

"No entanto, também por esse período as tribos de humanos modernos estavam em movimentação pelos territórios onde viviam essas criaturas, e muitos de nós acreditam que é muita coincidência que isso tenha acontecido exatamente quando esses animais desapareceram. Estas criaturas tinha sofrido milhões de anos de mudanças climáticas antes do homem aparecer, mas foi precisamente quando este surgiu que o fenómeno aconteceu”.

Mais de 20 mil elefantes foram mortos em 2012 para extrair o marfim. Os seus chifres são negociados, em mercados ilegais, com cotações superiores às do ouro. Os seres humanos modernos surgiram em África há cerca de 70.000 anos, viajaram por toda a Ásia e chegaram à Austrália há 50.000 anos, data que coincide com uma onda de extinção de criaturas neste continente, incluindo o diprotodonte, uma espécie de vombate que cresceu até ao tamanho de um hipopótamo moderno. Por volta de há de 14.000 anos, os humanos tinham atingido a América do Norte, atravessando o Estreito de Bering que ligava a Sibéria e o Alasca por uma pequena língua de terra. Em seguida, dirigiram-se para o sul. Por volta de há 10.000 anos, o Homo sapiens havia conquistado toda a América, de norte a sul, precisamente num momento cronológico que também coincide com grandes extinções da megafauna, incluindo a preguiça gigante e o gliptodonte.

"Pensamos em África e sudeste da Ásia com os seus leões, elefantes e rinocerontes como a principal casa de animais de grande porte nos dias de hoje, mas até há muito pouco tempo da história do nosso planeta, enormes criaturas prosperavam maravilhosamente bem na Austrália, América do Norte e América do Sul ", disse o professor Adrian Lister, do Museu de História Natural, em Londres. "A questão é a seguinte: porque desapareceram estes animais do novo mundo, mas sobreviveram no velho mundo?

"Alguns acreditam que é porque os grandes animais da África e sudeste da Ásia aprenderam a tornar-se cautelosos com os seres humanos e decidiram evitá-los a todo o custo. No entanto, eu também acho que as mudanças climáticas operadas quer nas Américas, quer na Austrália poderão ter contribuído para alterar e enfraquecer os habitats e os nichos ecológicos onde estes animais se moviam, e só depois de enfraquecidos é que se tornaram presas fáceis para os seres humanos que acabaram por os dizimar”, diz Adrian Lister.

Cientistas propuseram que algumas populações de animais gigantes deviam repovoar regiões de forma a poderem ajudar a restaurar as ecologias  e as condições de saúde anteriores que possuíam os ecossistemas. A ideia de que os seres humanos estiveram de alguma forma envolvidos no processo de erradicação de dezenas de espécies de animais gigantes, quando ainda éramos caçadores-coletores, tem importantes implicações. Pensava-se, até há relativamente pouco tempo, que só quando os humanos inventaram a agricultura, há vários milhares de anos atrás, é que a relação da nossa espécie com o mundo natural se tornou desequilibrada. Até então, os humanos tinham uma estreita afinidade com a natureza. Mas se os antigos caçadores-coletores desempenharam um papel na extinção dessas espécies de animais gigantes, então a suposta harmonia inata da humanidade com o mundo dos vivos parece equivocada, pelo menos desde há 50.000 anos.

A humanidade ainda está a pagar o preço pelo  desaparecimento da megafauna das Américas e Austrália, conforme será explicado na a conferência de Oxford. "Há agora uma grande quantidade de evidências que sugerem que os grandes herbívoros como os “gomphotheres”, uma espécie da família dos elefantes, que foram extintos na América do Sul por volta de há  9.000 anos, desempenharam um papel fundamental em áreas como a Amazónia. Eles comiam frutas da floresta, incluindo abacate, e os seus excrementos acabavam por fertilizar e polarizar a vegetação noutras áreas. Isso já não acontece e lugares como a Amazónia estão a ser atualmente afetados ", disse Yadvinder Malhi.

Outro exemplo é fornecido pelo diprotodonte, que alguns cientistas defendem que foram os principais responsáveis por manter os níveis de biomassa muito baixos. Quando o diprotodonte desapareceu, plantas e arbustos cresceram sem impedimentos. O resultado foi as grandes queimadas e incêndios florestais que se tornaram um grave problema logo após, por exemplo, o vombate gigante ter desaparecido da Austrália.

Da mesma forma, criaturas como o mamute tiveram um papel fundamental na manutenção de pastagens saudáveis em latitudes elevadas, como a Sibéria. "Tornou-se claro que a compreensão que temos da ecologia contemporânea é incompleta porque não tem em conta que os ecossistemas foram povoados por animais gigantes como o mamute ou o diprotodonte", diz Yadvinder Malhi."Estes não são sistemas naturais nos dias de hoje porque estão em falta componentes-chave que a maioria das plantas havia adotado", sublinha.


Esta consciência levou alguns cientistas a propor que algumas populações de animais gigantes deviam repovoar regiões de forma a poderem ajudar a restaurar as ecologias e as condições de saúde anteriores. Uma tal experiência já está a ser realizada pelo ecologista Sergey Zimov numa reserva natural chamada Parque do Pleistoceno, na Sibéria . Zimov reintroduziu o boi almiscarado, alces e outros animais de grande porte e está a monitorizar se a sua ação irá restaurar a paisagem para um ambiente próximo do original. Sergey Zimov é um dos participantes na conferência de Oxford. Outros investigadores vão ainda mais longe e propuseram trazer a megafauna extinta de volta à vida. Por exemplo, vários cientistas sugeriram que poderia ser possível clonar um mamute a partir dos restos congelados encontrados na Sibéria, utilizando um elefante asiático como uma “mãe de aluguer”.

Seja como for, e apesar das grande dificuldades e escolhos que poderão encontrar alguns projetos mais arrojados, é principio comummente partilhado por todos os investigadores que as questões ambientais e paleoambientais são de crucial importância para o equilíbrio saudável do planeta em que vivemos e que daremos de herança aos nossos vindouros. Na verdade, a verdadeira lição a tirar desta conferência será a de que destino da megafauna que ainda existe é de crucial importância para o nosso planeta. O ecologista da Universidade de Oxford, Emily Read, um dos organizador da conferência, sublinhou que "precisamos de proteger a megafauna que temos. Mais de 20 mil elefantes foram mortos em 2012 para extrair o marfim. Os seus chifres são negociados, em mercados ilegais, com cotações superiores às do ouro. Não é apenas o valor cultural destes animais de grande porte que precisa de ser repensado, mas também o facto de que se os exterminarmos se afetará irremediavelmente todo o ecossistema ".

Este artigo foi escrito com base em matéria publicada pelo jornal inglês The Guardian

Print Friendly Version of this pageImprimir artigo Get a PDF version of this webpagePDF

Utlizador

Sobre o utilizador

comments powered by Disqus

últimas 20 notícias

acompanhe - nos pelo facebook